sábado, 18 de dezembro de 2010

Eu quero tantas coisas

Eu queria tantas coisas
Queria não querer nenhuma delas, acima de tudo
Quanto menos se quer,
Mais próximo se está da felicidade

Acho que foi o Fernando Pessoa que me disse isto
Ele disse isto a mim, e eu queria ser como ele
Ficar na história e dizer coisas às pessoas
Coisas que ninguém disse, ou como ninguém disse

Queria ser importante
Eu sei que este é o querer mais perigoso
É o que mais tem me feito sofrer
É o que eu mais quero não querer

As pessoas não me conhecem
eu quero e não quero que seja assim
Eu tenho muitos medos
Eu queria não tê-los

Às vezes eu não queria ser como eu sou
O que é uma tolice, pois se só eu me entendo
Eu me amo, eu confio em mim e eu me apóio
Desde que os "eus" não sejam só eu mesmo

Eu queria ser mais claro e conciso
Queria ser mais eu, ou eu na maior parte do tempo
Mas eu não pareço tão legal na intensidade em que eu me mostro
E não me mostro mais, porque eu não quero

Eu quero ser feliz, nada além disso
Todos os outros quereres são desvios
que a minha mente inexperiente
inventa para eu querer

Cego

Enquanto eu ouço Stevie Wonder, eu me lembro da minha mãe me contando sobre a sua avó, que também era cega. Ela me conta que a velhinha passava as mãos sobre seu rosto e dizia que ela era bonita.
Que beleza as mãos enxergam?
Nariz, boca, olhos, cabelo. Todos os humanos tem, nos mesmos lugares.
De que beleza falava aquela velhinha?
Imagino, então, o pobre Stevie pedindo a sua esposa que descrevesse o rosto de sua filha, minunciosamente. Sorria, provavelmente, ao ter diante de si qualquer tipo de sensação que só sua filha o trouxesse. Isto lhe parecia bonito. Era o que podia alcançar, o que podia sentir. Quando "via" sua filha pelas palavras da esposa, pelos rostos que nunca vira, pelo amor que tinha por aquela criatura, estava diante da beleza.
Nós temos uma apego especial pelos nossos olhos que jamais nos imaginaríamos sem eles. Parece perder a vida.
Quando encaro a minha iminência de ficar cego, penso em como eu perderia a minha liberdade, sem notar o quanto já estou preso a ela. Na verdade, pensando na minha bisavó e no Stevie, eu ganharia uma vida nova, com novas dificuldades e uma superação ainda maior.
As dificuldades me parecem incrivelmente amigáveis quando eu penso no ser humano mesquinho que eu seria sem elas. Vejo gente por aí com tantas certezas que me dá pena.
Tudo o que parece me limitar, tem me amadurecido. Tudo o que eu não tenho, me mostra o que realmente importa para eu construir minha felicidade.
Vou chorar ainda muitas noites por não poder fazer isto ou aquilo do jeito convencional, mas também vou me divertir ao inventar o meu próprio jeito.