sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Expedição H1N1

Todos dormem, descansam a mente
As aves, os porcos, os homens...
N'outro lado do mundo
Acordam agradecidos

Subitamente o que pode ser incrível
surge terrívelmente forte
E nasce nossa imensa conspiração
Nós agora somos como os porcos.

Vai aterrisar suas imensas garras sobre nossa vida
e cuspirá a morte em cada parte dela
Enganados, iludidos doentiamente
Damos vida a morte

Uma nave Ribonucléica
fecunda o núcleo da nossa vida
Não temos escolha: respiramos
Enquanto houver pulmão

Uma nave lipo-protéica
minúscula e sem vida
A que todos conheciam bem
Que outrora acolheram em si

Hoje tem mais força
Hoje iguala todo homem a toda ave
Embora lhes diminua o ar
impedindo-os de voar

Hoje aterrisa breve e fatalmente
refaz-se em nossos pedaços
propulciona-se em nosso ímpeto
Destrói-nos em nossos nucleotídeos

É tão conhecida nossa
Feita de nós mesmos
Não é mais do que o que temos
Mas é mais do que um dia foi

De território em território, inesperadamente
Na calda das aeroaves
Nas rodas dos ônibus
Na velocidade do trem

Nas mãos
na boca
nos olhos
na face

No jornal das sete, oito, nove
Vinte e quatro padecidos
Vinte e sete confirmados
Uns bilhões desesperados

Hoje acordamos com "é isso mesmo."
Acordamos precavidos como nunca antes
Aterrorizados como nunca antes
Temerosos como nunca antes

Poupamos nosso futuro
para que talvez ele possa haver
Trancados em casa
Longe das naves vivas ou não

Há o caos de que ninguém fala
e que todos sussurram amedrontados
As nossas esperanças
adoeçem de nós mesmos

Nunca fomos tão enganados
Nunca fomos tão invadidos
e enquanto a falta nos desconforta
A presença nos enlouquece

Dirão que vem a cavalo
em branco, vermelho
em preto e baio
Debaixo de música e discórdia

Enquanto não soam as cornetas
Enquanto 1914 realmente acaba
Enquanto os selos não são tirados
Joãos, Zacarias e Danieis padecem da nave

Impávido que nem Muhammed Ali
Apaixonadamente como Peri
Tranqüilo e infalível como Bruce Lee
O axé do afoxé, filhos de Ghandi

Caíra primeiro sobre os pobres
Que juntos tremiam de frio
Que a curtiam no álcool
ou no sonho sulamericano

Há um rico se preparando
temendo o tempo
Há um rico trancado em casa
temendo o vento

Trará no ateu a fé
quando esta se afastar dos homens
e a ciência tardiamente
Nos tornar imunes ao que nos matou

Trará no forte o chão
Quadrúpede e ingênuo como um porco
A clamar por ajuda e zêlo
Ou pelo céu

Trará no visionário a dor
De nunca ter vivido
Por mais inventivo que fosse
Fora incapaz de inventar a cura

E todos os dias após
Serão grandes dias
E o corpo de quem resistir
será inóspito

Haverá valor na água
Haverá valor no sol
Haverá valor no beijo
Haverá valor no toque

Haverá valor na companhia
Haverá valor na diversão
Haverá valor na ciência
Haverá valor na conciência

Haverá valor nos Homens
Nos porcos, nas aves
Que jamais voaram tão imponentes
Sugando o ar e transformando em céu

Quero dormir denovo
e acordar sem este nó
quero afastar as minhas unhas da nuca preocupada
quero dar as mãos aos meus amigos e sentir suas vidas

Depois daqui, talvez haja
Aqui há
hei de viver aqui
Hei de morrer mais tarde



Como se fosse combinado (...) naquele dia ninguém saiu de casa.

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